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Quinta-feira, 28 - Março, 2024

ABASTECIMENTO DE ÁGUA POR PRIVADOS: Os “equívocos” que ameaçam consumidores

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WALTER MBENHANE

PAIRA sobre algumas famílias das cidades de Maputo e Matola a ameaça de não ter água a partir do dia 6, sábado próximo. Razão: “mal-entendidos” entre provedores privados do líquido e o FIPAG.

Muitos famílias dos municípios de Maputo e, principalmente, da Matola ainda consomem água fornecida por operadores privados, porque o provedor público não estava lá, por incapacidade ou por outras razões, quando as pessoas se instalaram nesses bairros.

Entretanto, nos últimos tempos, Fundo de Investimento e Património do Abastecimentos de Água (FIPAG), entidade pública, tem alargado a sua área de cobertura de fornecimento do líquido, entrando em áreas até aqui exploradas por privados.

Nesta sua tentativa de cumprir uma das missões primárias do Estado, propiciar os serviços básicos à população, o FIPAG é acusado pelos operadores privados de Estado de estar a praticar uma “concorrência desleal”.

Os privados dizem que o FIPAG entra em zonas onde eles já estão a operar há vários anos, sem que no mínimo haja diálogo entre as partes. Acusam ainda a entidade pública de, no processo de montagem da sua rede, não tomar o cuidado para não vandalizar as suas condutas.

E as alegações continuam. O FIPAG está a lhes retirar clientes, pois faz ligações domiciliares sendo que já há casas alimentadas por dois sistemas de abastecimento de água.

Mais grave, é que muitos consumidores “saltaram” para o serviço público, deixando dívidas com o anterior fornecedor privado.

Misto de incerteza e rejeição quanto à entrada do FIPAG   

FAMÍLIAS entrevistadas pela nossa Reportagem, que actualmente usam água fornecida pelos privados, foram unânimes em afirmar que estão receosos quanto a oferta do FIPAG.

Ana Bila, residente no bairro do Albazine, na cidade de Maputo, disse que usa água de privados há mais de 17 anos e esta jorra 24 horas por dia. Refere que nunca teve problemas com o seu fornecedor.

“Quando há alguma interrupção, não interessa de que natureza, basta uma simples comunicação ao fornecedor, este conserta e voltamos à normalidade. Quanto à entrada do FIPAG não sabemos se vai conseguir tomar conta”, disse.

Ginoveva Cossa, do bairro do Zimpeto, considera excelentes as relações entre as famílias e os fornecedores privados, na medida em que há cumprimento, na integra, das cláusulas contratuais.

“Mesmo quando nos chega uma factura com valores altos, temos oportunidade de negociar modalidades de pagamento. Só não temos água quando há problemas no fornecimento de energia eléctrica”, precisou.

Cristina Cossa, do bairro do Nkongolote, disse que ficou triste quando soube da possível paralisação no fornecimento de água por parte de privados.

“Nas zonas onde a rede pública opera a água não sai com regularidade. Tenho familiares que estão nesta situação e passam maus momentos. Não queremos que os privados sejam afastados porque nos fornecem água 24 horas por dia”, frisou.

Airina Manuel, residente no bairro Machava Bedene, Município da Matola, disse que não tinha conhecimento do anúncio de corte no fornecimento de água por parte dos privados.

“A ter que acontecer não sabemos como é que viveremos, porque há muito tempo que dependemos dos privados. Não sei se o FIPAG vai conseguir nos dar água devidamente”, disse.

Adelaide Bernardo, igualmente da Machava-Bedene, disse que está a usar água fornecida pelos privados há mais de sete anos e nunca teve problemas de cortes prolongados.

Em contacto com o “Notícias”, Amélia Moisés, do bairro Bunhiça, afirmou que não tem informação nenhuma sobre a intenção de corte no fornecimento de água por parte dos privados.

Privados começaram a perder seus clientes

ERNESTO Nguenha é operador privado desde 1997. Neste momento opera nos bairros Intaka II, Muhalazi, George Dimitrov, Munfuini, Macaneta e alguns pontos do distrito da Manhiça.

Com a entrada do FIPAG no bairro de Intaka II, segundo ele, perdeu mais de 600 clientes, de um universo de dois mil que tinha.

“É um problema que se arrasta desde 2010 e temos estado a dialogar com o Governo, sem sucesso. Já fizemos várias cartas através da nossa associação, mas nunca tivemos resposta satisfatória”, esclareceu.

Referiu que há já algum tempo, o FIPAG tem vindo a fazer a instalação da sua rede de distribuição e, neste momento, está a proceder com as ligações domiciliárias sem consulta prévia às famílias.

Cláudio Cumba é igualmente operador privado de água. Está na actividade há mais de nove anos no bairro de Intaka. Iniciou o negócio, com fundos próprios quando ficou desempregado.

Falando à nossa Reportagem, disse que está a perder clientes e não sabe como continuar com a actividade. Tinha 601 clientes e neste momento está com 300, situação que lhe deixa inseguro quanto ao futuro.

No seu entender, o Governo devia “atacar” bairros como Tsalala e Tchumene que não têm água, ao invés de zonas onde os privados estão a operar.

Saul Cabo, igualmente operador, disse que o negócio já não está a render, mas continuam a trabalhar porque têm compromisso com as famílias.

“Pedimos indemnizações paradesenvolvermos outros negócios”

OS operadores privados de água potável, contactados pela nossa Reportagem, pedem o pagamento de indemnização pelo Governo para poderem desenvolver outros negócios, perante as acções do FIPAG.

Ernesto Nguenha disse que a lei refere que quando o FIPAG chega numa zona onde haja um operador privado, a entidade pública deve indemnizar a este.

“Fizemos empréstimos bancários e poupanças para iniciarmos este negócio, daí que não seja justo o Governo afastar-nos sem indemnização. Se tivermos fundos, claramente, vamos iniciar outros negócios”, disse.

Na verdade, como indicou Saul Cabo, não é intenção dos privados paralisarem o fornecimento de água ou prejudicar as populações, mas é por falta de consenso com o Governo.

“A nossa produção está a baixar e não estamos a ter condições para continuarmos com o negócio. Temos despesas a pagar, desde a remuneração dos trabalhadores, pagamento no Instituto Nacional de Segurança Social, Finanças, energia, entre outros”, disse.

AFORAMO poderá se pronunciar esta semana

ADRIANO Chirute, presidente da Associação dos Fornecedores de Água de Moçambique (AFORAMO) disse ao “Notícias” que irá se pronunciar entre hoje e amanhã sobre a possibilidade de paralisação ou não no fornecimento.

“Neste momento, não posso falar sobre esse assunto porque há um diálogo em curso com o Governo. O certo é que os privados estão a ser lesados com a entrada do FIPAG”, disse.

Acrescentou que ele está a ser vítima, mas oportunamente irá convocar a imprensa para se pronunciar. Referiu que o desejo não é parar, mas buscar consenso com o Governo.

Privados são importantes para a provisão de água 

O MINISTRO das Obras Públicas, Habitação e Recursos Hídricos, João Machatine, afirmou que os fornecedores privados fazem parte da cadeia de fornecimento de água e jogam papel preponderante nos níveis de cobertura de abastecimento que o Governo pretende alcançar.

Só para ter uma ideia, referiu na sexta-feira, existem mais de 1800 operadores licenciados e todos perfazem uma cobertura de cerca de 24%, número considerado significativo.

“Os fornecedores privados são parceiros incontornáveis no processo de abastecimento de água. Eventualmente, possa ter havido um ruído na comunicação porque estes fazem parte da cadeia de abastecimento”, esclareceu.

A lei, afirmou, é clara no sentido de que caso o Governo invista na expansão da sua rede, deve se relacionar com os privados. Primeira saída é fazer a integração parcial dos sistemas; segundo, a integração total e a terceira é da co-existência, complementaridade dos sistemas privados e públicos.

“Esta situação está praticamente ultrapassada porque reuni com o presidente da associação e já constituímos uma comissão para responder as inquietações dos fornecedores privados”, garantiu.

O que se pretende saber é o seu futuro em relação à expansão da rede do FIPAG. Já foi criada uma plataforma de diálogo e vai-se chegar a um bom entendimento porque juntos se complementam.

“A água nunca vai ser suficiente para a demanda, daí que não devemos rejeitar qualquer que seja o investidor. Gostei de ouvi-los a dizer que não estavam contra o Governo, mas pediam diálogo”, disse.

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